19 fevereiro 2008

FONTES ENERGÉTICAS ALTERNATIVAS

Wellington Bahnemann - Agência Estado

O ano de 2008 começou com um quadro pouco animador para o desenvolvimento das fontes alternativas de energia no Brasil. As duas principais ações do governo federal na área, o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) e o Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB), ainda patinam em seus resultados e não cumprem as metas estipuladas inicialmente, o que revela a dificuldade que o País tem em explorar de maneira viável o grande potencial energético disponível em território nacional.
O saldo atual do Proinfa é prova do insucesso das políticas governamentais na área. Dos 3,315 mil MW contratados pelo programa, apenas 1,048 mil MW entraram em operação ao final de 2007. Ou seja, dos 144 empreendimentos classificados entre térmicas a biomassa, Pequenas Centrais Hidrelétricas e usinas eólicas, apenas 39 projetos estão disponibilizando energia para o sistema. Isso poderia até não ser problema se o balanço energético do País estivesse tranqüilo. Mas nesse momento de esvaziamento dos reservatórios das hidrelétricas, esses 2,266 mil MW indisponíveis poderiam contribuir junto com as térmicas a gás natural, óleo combustível e nuclear para poupar água das usinas.
Energia Eólica
Inicialmente, os 144 empreendimentos deveriam entrar em operação ao final de 2006. Mas o prazo não foi cumprido e o Ministério de Minas e Energia (MME) estabeleceu nova data para o final de 2008. Pelo levantamento da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), esse novo cronograma não deverá também ser cumprido. Dos 2,062 mil MW previstos para entrar em operação este ano, apenas 908,4 MW não possuem nenhum tipo de restrição nas obras. Nesse balanço, destaque negativo para a energia eólica. Isso porque 901,29 MW de energia da fonte possuem restrições à entrada em operação. De acordo com a agência, 33 projetos eólicos não iniciaram as obras, apesar de já possuírem licença de instalação.
O contraditório é que o programa ofereceu uma série de benefícios para atrair a iniciativa privada. Entre os benefícios estão a compra por 20 anos de toda a energia pela Eletrobrás e a garantia de que a estatal elétrica asseguraria ao empreendedor uma receita mínima de 70% da energia contratada durante o período de financiamento. Além disso, a Eletrobrás protegeria integralmente os investidores dos riscos de exposição do mercado de curto prazo. Se não bastasse isso, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) criou uma linha de financiamento para os projetos enquadrados no Proinfa.
Mesmo assim, o projeto emperrou desde o começo. Lançado em 2002 como uma política do governo federal para promover a diversificação da matriz elétrica, o Proinfa foi revisado em 2003 e enfrentou o primeiro problema logo no início, no processo de contratação da energia. Inicialmente, previa-se a contratação de 3,3 mil MW, sendo 1,1 mil MW de cada fonte. Após nova seleção, apenas 700,9 MW da fonte foram contratados. A diferença foi compensada pela maior adesão das usinas eólicas, somando 1,422 mil MW, e das PCH, que totalizaram 1,191 mil MW.
Vários são os motivos apontados para o modesto desempenho do Proinfa: a demora da regulamentação do programa pelo governo, o que só ocorreu em 2005; o excesso de burocracia do BNDES para o financiamento, que exige uma série de garantias dos empreendedores, encarecendo a operação; o movimento especulativo entre os titulares das concessões de PCH, que ganham o direito de construir as usinas e, em vez de executar o projeto, ficam a espera de um comprador para a outorga; problemas na indústria de equipamentos para usinas eólicas, já que existe apenas um fornecedor instalado no Brasil; e o preço, que foi considerado baixo - para eólica, a energia foi comprada a R$ 204/MWh, biomassa entre R$ 93/MWh e R$ 169/MWh, dependendo do insumo, e PCH a R$ 117/MWh.
Biodiesel
A exemplo do Proinfa, o PNPB também não decolou nesse início de obrigatoriedade da mistura de 2% (B2) ao diesel em 2008, ainda que seja necessário considerar que a indústria do biodiesel é algo recente na história brasileira. Entusiasmado pelo desempenho na produção de etanol, o governo federal enxergou também a oportunidade de repetir o mesmo sucesso no biodiesel, adicionando em sua estratégia de desenvolvimento da cadeia produtiva a participação da agricultura familiar, para gerar renda e emprego no campo.
Pelo caráter social, o PNPB é tido como uma das principais ações da política energética do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O programa foi estruturado para que os pequenos agricultores forneçam a matéria-prima, como mamona, dendê e pinhão-manso, para a produção do óleo vegetal, que posteriormente será transformado em biodiesel pelos produtores. Para estimular o funcionamento dessa cadeia produtiva, o governo federal criou o "Selo Combustível Social", que confere desoneração tributária, condições especiais de financiamento do BNDES e direito a participação nos leilões de compra do biocombustível organizados pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustível (ANP) para os produtores de biodiesel que comprarem a matéria-prima dos agricultores familiares.
A execução dessa estratégia é complexa. A começar pela dificuldade logística de recolher a matéria-prima de diversos agricultores familiares, que nem sempre estão próximos entre si, e levar para a unidade industrial de processamento. Além disso, o baixo emprego de tecnologia e a pequena escala da produção encarecem o valor da matéria-prima.
Soja
De acordo com o analista da consultoria Safras & Mercado, Miguel Biegai Junior, essa fragilidade da cadeia produtiva tem levado aos grandes produtores a comprarem o porcentual mínimo de matéria-prima previsto em lei para obter o selo social e, assim participarem dos leilões da ANP, porque os benefícios com a certificação não compensam os custos envolvidos com a operação. Isso explica, nesse sentido, a grande penetração da soja como principal insumo para a produção do biodiesel, aproveitando a economia de escala que possui o cultivo do grão.
De fato, hoje a soja é a única cultura em condições de suportar o crescimento da indústria de biodiesel no curto prazo. Outras culturas, como mamona e pinhão-manso, ainda são pouco produzidas no Brasil. Acontece que se a escolha da soja parecia um grande negócio, hoje esse é um dos principais motivos para o que PNPB esteja enfrentando dificuldades. Como lembrou Biegai Junior, a competição entre alimento e energia, estimulada pela alta da cotação do barril do petróleo, tem puxado para cima os preço das commodities agrícolas, como milho e soja.
O especialista disse que o preço do óleo de soja na Bolsa de Chicago passou de um patamar de 20 centavos de dólar por libra-peso, em 2006, para cerca de 50 centavos de dólar por libra-peso, em 2007. O preço atual representa mais de US$ 1 mil por tonelada do óleo, o que compromete a lucratividade do biodiesel na comparação com os preços em que o biocombustível foi vendido. Nos leilões da ANP, o insumo foi comercializado na faixa entre R$ 1,75 e R$ 1,86 o metro cúbico (equivale a mil litros). Segundo Biegai Junior, esses valores seriam abaixo do custo de produção. Para que os produtores tivessem retorno, esse preço deveria situar-se entre R$ 2,20 e R$ 2,40, considerando o custo atual do óleo.
Entusiasmo
Esse cenário atenua o entusiasmo em torno do biodiesel. O baixo preço do óleo de soja até 2006 e a alta do petróleo estimularam a construção de uma grande capacidade instalada no País. Hoje, a capacidade autorizada pela ANP totaliza 2,7 bilhões de litros de biodiesel, ainda que a demanda do B2 é de apenas 840 milhões de litros. Apesar do excesso de oferta, apenas 45% dos 885 milhões contratados em cinco leilões da ANP, realizados entre 2005 e 2007, foram entregues. Recentemente, o Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes (Sindicom) afirmou que os produtores de biodiesel haviam deixado de entregar cerca de 20% do volume contratado logo na primeira semana de 2008.
Além do alto custo, o óleo de soja não é o mais propício para o biodiesel. O ideal seria a produção a partir de outras culturas, como pinhão-manso. Nem a mamona Biegai Junior considera que seria interessante, porque o óleo desta planta tem muito mais valor na indústria química. O produto, por exemplo, é utilizado como lubrificante de avião, que remunera muito mais do que o biodiesel hoje. Nesse sentido, o especialista crê que o biodiesel só terá sucesso se seguir o caminho do etanol, ou seja, de investir maciçamente em pesquisa para aumentar a produtividade por hectare de culturas perenes e reduzir o custo do óleo por tonelada

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